Religiosidades

Nessa longa seção, em que abordamos basicamente a religiosidade indiana, tratamos daquilo que fundamenta a construção de uma indianidade, ou seja; sua visão cósmica e transcendente da existência. Abrangente, rica, intensa, multifacetada, ela dá sentido ao axioma indiano que auto-define sua civilização: a ‘unidade na diversidade’. Nos 3 primeiros textos, temos uma explanação sobre a religiosidade ariana, contida nos textos védicos (séc.-15?); seus primeiros deuses, a estrutura inequívoca de seus politeísmo e o culto do soma, bebida alucinógena que permitia aos praticantes visões reveladoras, mostrando essa ligação profunda com os ritos xamânicos. No texto 4, do atharva-veda (séc. -7?), fragmentos desse texto absolutamente diferente dos outros 3 vedas, trazendo aspectos da magia antiga dos indianos. No brahmana, novamente, as especulações que acompanham – ou atormentam? – essa religiosidade, em busca de um sentido sobre suas origens e existência, dando um dinamismo próprio e instigante ao hinduísmo; quanto ao desapego e o conhecimento verdadeiro, esses são apresentados nos upanishads, e complementado por um trecho especulativo presente no atharva veda; o mecanismo da reencarnação é explicado nas leis de manu, e a libertação do ciclo de renascimento é apresentada num fragmento da ‘canção do senhor’ (bhagavad gita), presente no mahabharata; quanto a questão da composição da alma, resgatamos um diálogo saboroso (provavelmente do séc. -3 ou -2) entre um rei grego e um sábio budista, presente nessa obra única chamada milinda panha, escrita nos tempos em que os gregos dominavam pedaços da Índia e estabeleceram um debate fértil entre o pensamento grego, o hinduísmo e o budismo; do garuda purana (séc.+13?), explicações sobre o destino da alma após a morte; quanto aos 4 pilares da vida indiana, eles são explicados apropriadamente na introdução do kamasutra (séc. +3?), um texto fundamental para a vida social e religiosa indiana, ao contrário do que o ocidente vulgarizou; os dharma sutras complementam as leis de manu, reproduzindo um código sofre a vida ideal do asceta; a visão religiosa jaina (com o qual o budismo guarda semelhanças) é apresentada aqui sucintamente, de modo a fazer sentido e dar continuidade a análise budista no basilar texto do dhamapada (a visão budista do dharma, ou dhamma em páli); os éditos ecumênicos de Ashoka (-302 – 234) mostram o estabelecimento da tolerância religiosa na Índia, numa época em que o budismo e o jainismo conflitavam com as concepções tradicionais do hinduísmo. O trecho de caitanya (séc. +15) representa a síntese do pensamento devocional a Vishnu, cuja contraparte são os trechos do shivaísmo, no seguir; esses dois movimentos dominam, até os dias de hoje, a religiosidade popular na Índia. O culto tântrico e cujo erotismo sagrado se devota a grande mãe é o tema do trecho seguinte, tendo sido produzido (aparentemente) no séc. +12; o misticismo indiano resplandece nos versos de Kabir (1440-1518) e na origem do Sikhismo, dedicado ao guru Nanak (1469 – 1538), que surgem como respostas ao crescimento do islã na Índia; por outro lado, o Dabistan (dabestan e mazaheb, séc. +17 aprox.), escrito em persa, é fruto de uma política de tolerância universal pregadas pelos moguls (sulak kul) iniciada pelo soberano Akbar – ele mesmo, fundador de uma religião que congregava todas as outras, e do qual era o líder. O dabistan é, provavelmente, o primeiro manual de história das religiões mundial, criando um debate fantástico entre elas.
O pensamento multireligioso seria novamente trazido em questão durante o período da dominação inglesa, quando o hinduísmo reivindicava sua posição de religião autêntica e viva; Ramakrishna (1836-1886), cultuador da grande mãe, foi ele mesmo um defensor da unicidade das religiões; seu discípulo Vivekananda (1863-1902) foi seu continuador, defendendo a criação de um hinduísmo proselitista e mundial; Gandhi não ficou atrás, exponde seu ponto de vista que combinava ética, religião e política, reinterpretando o hinduísmo antigo dentro de uma perspectiva moderna, e influenciada pelo pensamento ocidental; Aurobindo Ghose (1872-1950), influente pensador indiano, via a religião também como um fator de união e identificação da indianidade, quase dentro de um caráter nacionalista; Radakrishnan (1888-1975), emérito intelectual indiano (chegou mesmo a ser vice-presidente indiano) analisa o hinduísmo em face do mundo moderno; e R. Panikkar (2010), autor da teoria da interculturalidade, defendeu a própria integração das visões religiosas, dentro de uma visão que ele mesmo considerava como “hindu-cristã” tradicional.


31. Aspectos da religiosidade ariana no Rig Veda

O homem protegido de Varuna, Mitra e Ariaman, subjuga prontamente seus inimigos.
Quem for beneficiado por eles com riquezas que parecem provenientes do trabalho; quem for por eles protegido contra os malvados nada há de temer, pode ter a certeza de que vai prosperar.
Os reis - Varuna, Mitra, Ariaman -, destroem os inimigos daqueles que os adoram e afastam os efeitos das más ações.
Aditias, que vinde aos sacrifícios, o vosso caminho é fácil e sem espinhos. Aqui não se faz oferta indigna de vós.
Aditias, seja para vós motivo de satisfação o sacrifício ao qual vindes por um caminho reto.
O mortal a quem favoreceis, livre do mal, obtém preciosas riquezas e descendentes, que lhe são semelhantes.
Amigos, como iremos recitar louvores dignos da glória deslumbrante de Mitra, de Varuna, de Ariaman?
Eu não recomendo o homem que insulta um devoto dos deuses. Cuido, sim, de obter a vossa benevolência, apresentando-vos as minhas ofertas.
O vosso adorador não gosta de falar mal de quem quer que seja. Ao contrário, receia a maledicência como o jogador teme o adversário, antes do lance dos quatro dados.

........

Indra voraz levantou-se com o ardor do cavalo a aproximar-se da égua, a fim de participar das abundantes libações do sacrifício. Deteve seu carro esplêndido e bem atrelado. Ele, que se distingue pelos atos heróicos, participa da libação.
Trazendo ofertas, os seus adoradores rodeiam-no, como se fossem mercadores ávidos de ganho, em torno de navios em que irão atravessar o oceano. Venham logo, entoando louvores ao poderoso Indra, protetor do sacrifício solene. Venham como se fossem mulheres a subirem um monte para a colheita de flores.
Ele é poderoso e rápido em suas ações. Nos combates, a sua bravura destrutiva brilha ao longe tal como o cimo de um monte. Revestido de armadura de ferro, derrotou o astucioso Susna.
Uma força divina acompanha Indra como o sol acompanha a aurora. Ele espanca os inimigos rudemente, e por isso estes soltam altos gritos.
Indra, quando distribuíste pelo céu as águas, sustentáculo da vida, as águas ocultas, animado pelo suco do soma, correste ao combate e soltaste do alto um oceano de águas.
Poderoso Indra, fizeste descer do céu sobre a terra a chuva, sustentáculo do mundo. Animado pelo suco do soma, liberaste as águas e esmagaste Vrita sob um rochedo.


32. Hinos religiosos do Sama Veda

Ahi - Agni divino, louvam-te estes homens a fim de adquirirem força. Destrói seus inimigos, cura-os das duas doenças.
Vamadeva - Imploro-te com as minhas preces. Es o mensageiro dos deuses, o possuidor de toda riqueza, o portador das ofertas, o imortal, o grande sacrificador.
Em tua presença colocam-se as irmãs, devoradoras do sacrifício. Elas concedem riqueza e andam por todos os lugares.
Maduchhanda - Agni, que desfazes as trevas, nós nos aproximamos de ti, todos os dias, com nossa mente esclarecida, prosternando-nos.
Sunassepa - Agni, conheces a maneira de se louvarem os deuses, sabes qual o gênero de louvores com que se obtêm os favores de Rudra, que aperfeiçoa todo sacrifício feito na moradia dos homens.
Medatiti - És convidado ao excelente sacrifício. Bebe o sumo da planta da lua. Vem, Agni, acompanhado dos Maruts.
Sunassepa - Desejo adorar-te com os ritos sagrados, tu que és como um cavalo de guerra e que brilhas acima dos sacrifícios.
Assim como te chamaram Aurva e Bhrigu, assim te chamas Agni o puro, residente no oceano.
Que o homem esclarecido por Agni execute o sacrifício sem distrair-se. Sou o homem que acende Agni com as ofertas que dissipam as trevas.
Vatsa - Agora, os homens olham a luz admirável, outrora unida às águas e hoje no firmamento.

....

Namadeva - Nós nos refugiamos ao lado do rei Soma, Varuna, Agni, Aditia, Visnú, Suria, Brahma e Vriaspati.
Os conquistadores da terra elevam-se do mundo inferior às altas regiões do céu, tal como subiram ao paraíso os descendentes de Angiras.
Nós te acendemos, Agni, a fim de nos concederes grandes riquezas. Tu que fazes chover as bênçãos, aprova nossos manjares excelentes, próprios para os sacrifícios, produto do Céu e da Terra.
Gritsamada - Tudo quanto dizemos é ex- pressão sincera do nosso pensamento. Agni sabe onde se servem as ofertas dos sacrifícios. Assim como o céu envolve o horizonte, assim Agni inspira os nossos cânticos.
Paiú - Agni, destrói em toda parte o funesto esplendor dos nossos inimigos. Destrói o poderio e a força dos gigantes Iatudanas.
Prascanva - Agni, prepara aqui um excelente sacrifício para os Vasús, os Rudras, os Aditias, e para os outros deuses, descendentes de Manú, para as divindades que trazem a chuva.


33. Rito ariano do Soma no Rig veda

Indra, que aceitas nossos louvores, conduzam-te até aqui os teus corcéis, a fim de beberes o suco do soma. Celebram tua presença os sacerdotes radiantes como o sol.
Conduzam Indra os seus corcéis a puxarem um carro leve e rápido, quando estas sementes desfeitas em manteiga clarificada estiverem sobre o altar.
Nas cerimônias matinais, invocamos Indra. Invocamo-lo, durante o sacrifício. Convidamos Indra a beber o suco do soma.
Vem, Indra, presenciar nossos sacrifícios com teus cavalos de longas crinas. Nós te invocamos, depois de bebermos a libação.
Aceita nossos louvores, vem aos nossos sacrifícios, para os quais preparamos a libação. Bebe como um cervo sedento.
Derramamos o suco do soma sobre a erva sagrada. Bebe-o, Indra, para seres mais vigoroso.
Que te seja agradável e aceito no coração o nosso canto. Bebe a libação que derramamos.
A fim de beber o suco do soma, Indra, o destruidor dos inimigos, acha-se presente em todas as cerimônias, em que se faz libação do suco do soma.
Satakrata, realiza nossos desejos, dá-nos gado e cavalos, Nós te louvamos com nossa profunda meditação.


34. Encantamentos mágicos do Atharva veda

Para deter a Menstruação
As virgens que vão além, as veias, vestidas em roupas vermelhas, como irmãs sem um irmão, despidas de força, elas pararão!
Pára, tu que estás abaixo, pára, tu que estais acima; e tu que estais no meio, pára também! As menores veias param; que pare também a grande artéria!
Das centenas de artérias e milhares de veias, as do meio realmente pararam. Ao mesmo tempo os extremos cessaram de fluir.
Por volta de ti passou um grande dique de areia: a fica parado, rogo-te calma!

Para a confecção de um talismã de ouro, que sendo usado possibilita longa vida
Nascido do fogo, este ouro foi concedido aos mortais como objeto imortal. Merece-o quem sabe disto. Quem usá-lo morrerá velho.
O ouro de belo colorido, desde os primeiros tempos procurado pelos homens e por seus filhos, o ouro brilhante derrame sobre ti o seu fulgor. Gozará de longa vida quem usá-lo.
Eu te entrego isto para a tua longa vida, para o brilho, a força e o vigor. Entre os outros homens, resplandeças com o brilho do ouro.
Conhecido do rei Varuna, do deus Briaspati, de Indra, matador de Vrita, obtenhas longa vida e prestígio por este talismã.

Para obter o amor de uma mulher
Deseja meu corpo, meus pés, meus olhos! Deseja minhas coxas! Teus olhos, teus cabelos, amorosa, sofram de paixão por mim!
Faço que te agarres ao meu braço, apegando-te ao meu coração. Estejas submissa à minha vontade e sob o meu domínio.
Vacas, mães da manteiga sagrada, cuidadosas dos vossos bezerros, fazei que esta mulher me ame!
Como o cipó enrola-se na árvore, assim não te afastes de mim, sê minha amante!
Como a águia ao levantar vôo toca no chão com as asas, assim eu toco em teu coração. Sê minha amante e não te afastes de mim!
Como o sol envolve a Terra na mesma luz, assim eu envolvo o teu coração. Sê minha amante e não te afastes de mim!


35. Cosmogonia, no sataphata brahmana

Na verdade, de início este universo era água, nada mais que um mar de água. As águas desejaram: "Como podemos reproduzir?” Elas se esforçaram e praticaram devoções fervorosas, e quando se estavam aquecendo foi produzido um ovo dourado. O ano, na verdade, não estava então em existência - esse ovo dourado flutuou durante o espaço de um ano.
No período de um ano um homem, este Prajapati,a foi produzido dali, e por isso uma mulher, uma vaca ou uma égua gera dentro do espaço de um ano, pois Prajapati nasceu em um ano. Ele rompeu o ovo dourado. Não existia então, na verdade, qualquer lugar de descanso; apenas esse ovo dourado, trazendo-o, flutuava durante todo o espaço e um ano.
No finai de um ano, ele tentou falar. Disse "bhuhr", palavra que se tornou esta terra; - "bhuvar", que se tornou o ar; - “svar", que se tornou o céu além. Por isso uma criança tenta falar ao fim de um ano, pois ao fim de um ano Prajapati tentou falar.
Quando falava ela primeira vez, Prajapati dizia palavras de uma sílaba e de duas sílabas; por isso uma criança, quando fala pela primeira vez, diz palavras de uma e duas sílabas.
Essas três palavras consistem em cinco sílabas e ele as tornou as cinco estações. Ao final do primeiro ano, Prajapati subiu para estar sobre essas palavras assim produzidas; por isso uma criança tenta estar de pé ao fim de um ano, pois ao um de um ano Prajapati ficou de pé.
Ele nasceu com uma vida de mil anos; assim como alguém poderia ver a distância a costa em frente, assim ele olhou a costa a frente de sua própria vida,
Desejando ter progênie, continuou a cantar louvores e a trabalhar.
Estabeleceu o poder de reprodução em seu próprio eu. Pelo alento de sua boca criou os deuses - os deuses foram criados ao entrar no céu; e esta é a divindade dos deuses, a que tenham sido criados ao entrar no céu. Tendo-os criado houve, por assim dizer, dia para ele e esta é também a divindade dos deuses, a que, depois de criá-los, houve, por assim dizer, dia para ele.
E pelo alento ou respiração para baixo, ele criou os Asuras - que foram criados entrando nesta terra. Tendo-os criado houve, por assim dizer, treva para ele.
Agora que a luz do dia, por assim dizer, existia para ele, ao criar os deuses, isso ele fez o dia; e a treva, por assim dizer, que havia para ele, ao criar os Asuras, disso ele fez a noite - eles são esses dois, o dia e a noite.


36. O Desapego como via de libertação, no Isha Upanishad

No coração de todas as coisas, de tudo o que existe no Universo, habita Deus. Somente ele é realidade. Portanto, renunciando às vãs aparências, rejubilai-vos nele. Não cobiceis a riqueza de ninguém. Bem pode ficar satisfeito de viver cem anos aquele que age sem apego - que realiza seu trabalho com zelo, porém sem desejo, não ansiando por seus frutos - ele, e somente ele.
Existem mundos sem sóis, cobertos pela escuridão. Para esses mundos vão depois da morte os ignorantes, assassinos do Eu.
O Eu é um só. Sendo imóvel, ele se move mais rápido do que o pensamento. Os sentidos não o alcançam, pois ele sempre vai primeiro. Permanecendo imóvel, ultrapassa tudo o que corre. Sem o Eu, não há vida.
Para o ignorante, o Eu parece mover-se - embora ele não se mova.
Ele está muito distante do ignorante - embora esteja próximo. Ele está dentro de tudo, e está fora de tudo.
Aquele que vê todos os seres no Eu, e o Eu em todos os seres, não odeia ninguém.
Para a alma iluminada, o Eu é tudo. Para aquele que vê harmonia em todos os lugares, como pode haver ilusão ou pesar?
O Eu está em todos os lugares. Ele é brilhante, imaterial, sem mácula de imperfeição, sem osso, sem carne, puro, intocado pelo mal. Aquele que vê, Aquele que pensa, Aquele que está acima de tudo, o Auto-Existente - ele é aquele que estabeleceu a ordem perfeita entre objetos e seres desde o tempo que não tem princípio.
À escuridão estão destinados os que se dedicam apenas à vida no mundo, e a uma escuridão ainda maior os que se entregam apenas à meditação.
Viver somente no mundo leva a um resultado, meditar apenas leva a outro. Assim falaram os sábios.
Aqueles que se dedicam tanto à vida no mundo como à meditação superam a morte através da vida no mundo e atingem a imortalidade através da meditação.
À escuridão estão destinados os que cultuam somente o corpo, e a uma escuridão ainda maior os que veneram apenas o espírito.
Cultuar somente o corpo leva a um resultado, venerar apenas o espírito leva a outro. Assim falaram os sábios.
Os que veneram tanto o corpo como o espírito, pelo corpo vencem a morte, e pelo espírito atingem a imortalidade!
A face da verdade está oculta por vosso orbe dourado, ó Sol. Removei-o, para que
Eu, que sou dedicado à verdade, possa contemplar a sua glória!
Ó vós que alimentais, o único que vê, o que tudo controla - Ó Sol que ilumina, fonte de vida para todas as criaturas - retende a vossa luz, reuni os vossos raios. Possa
Eu contemplar através da vossa graça a vossa forma mais abençoada. O Ser que aí habita - mesmo esse Ser sou Eu.
Permiti que minha vida agora se una à vida que tudo permeia. As cinzas são o fim do meu corpo. OM... Ó mente, lembrai-vos de Brahman. Ó mente, lembrai-vos das vossas ações passadas. Lembrai-vos de Brahman. Lembrai-vos das vossas ações passadas. Ó deus Agni, levai-nos à felicidade. Vós conheceis nossas ações. Preservai-nos da ilusória atração do pecado. A vós oferecemos nossas saudações, uma e outra vez


37. Brahman, a realidade última de tudo, no Kena Upanishad

Quem comanda a mente para que ela pense? Quem ordena que o corpo viva? Quem faz a língua falar? Quem é o Ser radiante que conduz o olho à forma e à cor, e o ouvido ao som?
O Eu é o ouvido do ouvido, a mente da mente, a fala da fala. Ele também é o alento do alento, o olho do olho. Ao abandonarem a falsa identificação do Eu com os sentidos e com a mente, e ao saberem que o Eu é Brahman, os sábios, ao deixarem este mundo, tornam-se imortais.
O olho não o vê, nem a língua o exprime, nem a mente o alcança. Não o conhecemos e nem podemos ensiná-lo. Ele é diferente do conhecido, e diferente do desconhecido. Foi o que ouvimos dos sábios.
Aquilo que não pode ser expresso em palavras mas pelo qual a língua fala - sabei que é Brahman. Brahman não é o ser que é adorado pelos homens.
Aquilo que não é compreendido pela mente, mas pelo qual a mente compreende - sabei que é Brahman. Brahman não é o ser que é adorado pelos homens.
Aquilo que não é visto pelo olho, mas pelo qual o olho vê - sabei que é Brahman. Brahman não é o ser que é adorado pelos homens.
Aquilo que não é ouvido pelo ouvido, mas pelo qual o ouvido ouve – sabei que é Brahman. Brahman não é o ser que é adorado pelos homens.
Aquilo que não é trazido pelo sopro vital, mas pelo qual o sopro vital é trazido, sabei que é Brahman. Brahman não é o ser que é adorado pelos homens.
Se pensais que conheceis bem a verdade de Brahman, sabei que conheceis pouco. O que pensais ser Brahman no vosso Eu, ou o que pensais ser Brahman nos deuses - não é Brahman. Deveis, portanto, aprender o que é realmente a verdade de Brahman.
Não posso dizer que conheço Brahman totalmente. Nem posso dizer que não o conheço. Aquele dentre nós que melhor o conhece é quem entende o espírito das palavras: "Eu nem sei que não o conheço".
Aquele que verdadeiramente conhece Brahman é quem sabe que ele está além do conhecimento; aquele que pensa que sabe, não sabe. O ignorante pensa que Brahman é conhecido, porém os sábios sabem que ele está além do conhecimento.
Aquele que percebe a existência de Brahman por trás de todas as atividades do seu ser - seja sensação, percepção ou pensamento - somente ele obtém a imortalidade. Através do conhecimento de Brahman, vem o poder. Através do conhecimento de Brahman, revela-se a vitória sobre a morte.
Abençoado o homem que enquanto ainda vive percebe Brahman. O homem que não o percebe sofre sua maior perda. Quando deixam esta vida, os sábios, que perceberam Brahman como o Eu em todos os seres, tornam-se imortais.


38. Meditação sobre o surgimento dos humanos, do Atharva veda

Quem ajustou os calcanhares do homem? Quem produziu a carne? Por quem foram feitos os tornozelos, os dedos, que modelam, os orifícios do corpo, os dois pilares que saem do centro, e o assento?
Por que os tornozelos abaixo das rótulas? Como se separam as pernas? E as articulações dos joelhos, quem o sabe?
Sendo um cubo de lado bem feito, o tronco ereto e flexível combina com os joelhos. Coxas e ancas, que sujeitam a espinha dorsal, quem as fez?
Quantos e quais os deuses que arranjaram o peito e a nuca do homem? Quantos ajustaram os seios e os cotovelos? Quantos arrumaram as espáduas e as costelas?
Qual o deus que, enquanto estava fazendo os braços, dizia: "é para o homem trabalhar com isto"? Qual o deus que ajustou as espáduas sobre a espinha dorsal?
Quem furou os sete orifícios na cabeça? Quem ajustou as orelhas, as narinas, os olhos, a boca? Por isso, homens e animais, de mil maneiras, todos andam, resolutamente.
Colocou a língua dentro da boca e nela depôs a poderosa palavra. Desde então, envolto nas águas, o homem gira pelos mundos. Quem o compreende?
Depois de arrumar o cérebro humano, a testa, o toutiço, e todo o crânio, depois de combinar as partes dos maxilares, ele, o primeiro, subiu ao céu. Quem é esse deus?
Todas as coisas, agradáveis, desagradáveis, o sono, o abatimento, as delícias e os gozos, de onde as extrai o homem poderoso?
De onde lhe vêm a desgraça, a ruína, a perdição, a desvalia? Êxito, bom sucesso, ganho, favor, prestígio, de onde lhe vêm?
Quem nele derramou as águas, que se escoam em vários rumos e não cessam de girar, nascidas para correrem nos rios, as águas, vivas, amarelas, vermelhas, cobreadas, embriagantes, que estão em cima, em baixo, dentro do homem?
Quem lhe deu forma, estatura, nome? Quem o fez andar? Quem lhe deu um caráter distinto? Quem lhe doou a gesticulação?
Quem fez a expiração, a inspiração, a transpiração? Qual o deus a quem o homem deve a conspiração?
Quem inspirou o dever do sacrifício? Qual o deus único? Que é o real? Que é o irreal? De onde vem a morte, de onde vem a não-morte?
Quem o vestiu e marcou a duração da existência? Quem lhe deu vigor? Quem o fez veloz?
Quem estendeu as águas? Quem fez o dia resplandecente, acendeu a aurora e mostrou o crepúsculo?
Quem criou no homem o esperma e disse: "é para ele ter uma descendência?" Quem lhe possibilitou o conhecimento? Quem lhe trouxe a música, as danças?
Por quem foi a terra coberta, o firmamento ultrapassado, as montanhas transpostas? Por quem foram feitas as obras e ele próprio, o homem?
Por quem reverencia ele a Parjania, a Soma, àquele que vê longe? Por quem são feitos o sacrifício e a fé? Por quem desceu até ao homem a inteligência que nele reside?


39. A transmigração da alma, no manavadharmashastra

A ação, que advém da mente, da fala e do corpo, produz resultados bons ou maus; pela ação são causadas as diversas condições humanas, as mais elevadas, as médias e as mais baixas.
A mente é o instigadora aqui embaixo, mesmo aquela ação ligada ao corpo, e que é de três tipos, tem três localizações e se classifica sob dez títulos.
Cobiçar a propriedade alheia, pensar no coração sobre o que é indesejável e aderir a doutrinas falsas são os três tipos de ação mental pecaminosa.
Injuriar o próximo, dizer mentira, detrair dos méritos de todos os homens e falar frivolamente serão os quatro tipos de ação verbal má.
Tomar o que não foi dado, ferir as criaturas sem a sanção da lei e manter relações criminosas com a mulher do próximo são declarados como os três tipos de ação corporal ruim.
Um homem consegue o resultado de ato mental bom ou mau em sua mente, o de um ato verbal em sua fala e o de um ato corporal em seu corpo.
Em conseqüência de muitos atos pecaminosos cometidos com seu corpo, no nascimento seguinte um homem se toma algo inanimado; em conseqüência de pecados cometidos pela fala, uma ave ou um animal, e em conseqüência de pecados mentais ele nasce novamente em uma casta inferior.


40. A libertação da alma, no Bhagavad gita

Arjuna disse:
ó Janardana, ó Keshava (Krishna), se para o teu espírito (o caminho da) sabedoria é superior ao (caminho) da ação, porque estás me engajando nesta terrível ação?
Com estas palavras que parecem contraditórias estás conturbando o meu entendimento; dize-me, pois, com certeza, com qual delas poderei atingir o mais alto.
O Senhor Abençoado disse:
ó sem-pecado, neste mundo é duplo o caminho que já descrevi. O caminho da sabedoria é para os meditativos, e o caminho do trabalho é para os ativos.
Um homem não alcança a liberdade pela ação deixando de executar a ação, nem atinge a perfeição simplesmente com o abandonar a ação.
Ninguém pode jamais descansar por um instante sem executar ação, porque todos são impelidos pelas Gunas (qualidades) filhas de Prakriti (Natureza) a um agir incessante. Aquele que, restringindo os órgãos de ação, se queda com pensamentos de objetos do sentido na mente, é um que se ilude a si próprio, e é chamado um hipócrita.
Mas, ó Arjuna, aquele que, controlando os sentidos com a mente, segue desprendido o caminho da ação com os seus órgãos de ação, é apreciado o
8. Executa, portanto, ações justas e obrigatórias, porque a ação é superior à inação. Sem trabalho, até a manutenção desnuda do teu corpo seria impossível.
9. Este mundo está ligado por ações, exceto quando elas são praticadas por causa de Yajna. Assim, pois, ó filho de Kunti, pratica a ação com desprendimento.
10. No principio o Senhor das criaturas, tendo criado a humanidade, juntamente com Yajna, disse: “Por elas (Yajna) prosperaremos e obteremos todos os resultados desejados, como Kamadhuk”.


41. A composição da Alma, no Milinda Panha

O Rei Milinda foi procurar o Venerável Nágasena, trocou cumprimentos educados e amistosos e tomou assento, respeitosamente, sobre um só lado. Então, Milinda começou a perguntar:
- “Como é o Reverendo conhecido e qual o seu nome?” – “Oh Rei! Sou conhecido como Nágasena mas isto é apenas uma designação de uso comum, porque nada de permanente e individual pode ser encontrado nisso.”
Então, Milinda chamou os Gregos Bactrianos e os monges para testemunharem: “Este Nágasena diz que nada de permanente e individual pode ser encontrado num nome. É possível concordar com isto?” Então, voltou-se para Nágasena e disse: “Se, Venerável Nágasena, isto é verdade, quem lhe dá mantos, comida e abrigo? Quem vive a vida correta? Ou novamente, quem mata seres vivos, rouba, comete adultério, mente e usa intoxicantes? Se o que o senhor diz é verdade, então não há mérito nem demérito, tampouco quem pratique as boas ou más ações nem resultado algum do karma. Se, Venerável Ser, um homem o assassinasse, não haveria assassinato e, por conseguinte, não haveria mestres nem professores em sua Ordem. O senhor afirma que se chama Nágasena, agora, o que é Nágasena? É o cabelo?
“Eu não digo isso, Grande Rei.”
“Então é as unhas, dentes, pele ou outras partes do corpo?”
“Certamente que não.”
“Ou é o corpo, ou sentimentos, ou percepções, ou formações ou a consciência? É isto tudo combinado?”
Nágasena respondeu: “Nada destas coisas.”
“Então, como posso perguntar, não posso descobrir Nágasena algum. Nágasena é um som vazio. Quem é que está aqui, diante de nós? O que o Venerável acabou de dizer é falso.”
“O Grande Rei sempre esteve coberto de grande luxo, desde que nasceu. Como veio até aqui – a pé ou numa carruagem?”
“Em uma carruagem, Venerável Ser.”
“Então, explique Grande Rei, o que é a carruagem. É o eixo das rodas? Ou as rodas, ou os chassis, ou as rédeas, o que é a carruagem? É tudo isso combinado ou não é nada destas coisas?”
“Não é nada destas coisas, Venerável Ser.”
“Então, Grande Rei, a carruagem é um som vazio. O Grande Rei falou algo falso ao dizer que veio até aqui numa carruagem. O senhor é um Grande Rei da Índia. A quem teme para não poder dizer a verdade?” Então, ele chamou os monges e os Bactrianos Gregos como testemunhas: “Este Rei Milinda disse ter vindo aqui de carruagem mas, quando perguntado sobre o que é uma carruagem, não foi capaz de dizer. Podem concordar com isto?”
Os quinhentos Gregos Bactrianos aprovaram e disseram ao rei, “Saia desta, se puder!”
“Venerável Ser, eu falei a verdade. É por ter todas essas partes que a carruagem é definida com esse termo.”
“Muito bem, Grande Rei, Vossa Majestade captou o significado correto. Da mesma forma, é por causa dos 32 tipos de matéria orgânica no corpo humano e dos Cinco Agregados da Existência que eu me tornei conhecido como “Nágasena”. Como foi dito pela Irmã Vajíra na presença do Buddha, “É exatamente por haver várias partes que a palavra “Carruagem” é usada, exatamente por haver os Agregados da Existência que falamos sobre uma existência.”
“Maravilhoso, Nágasena, extraordinário o modo como resolveu este quebra-cabeça, embora fosse difícil. Se o próprio Buda estivesse aqui, ele teria aprovado sua resposta.”


42. Fantasmas no hinduísmo, do garuda purana

Garuda perguntou: Mas às vezes as pessoas vêem fantasmas. Como eles conseguem fazer isso? Como eles escapam do inferno?
- Da mesma forma que os prisioneiros fogem da prisão, respondeu Vishnu. Eles vêm perturbar os seus amigos e parentes.
Eles retornam para suas casas antigas e causam todos os tipos de doenças, como febre. Eles com certeza estão presentes quando as pessoas têm dores de cabeça ou de cólera. Quanto mais eles amavam seus entes queridos, quando eles estavam vivos, mais mal que causam como fantasmas. É no kaliyuga que se tem todos esses fantasmas. Não houve tais fantasmas na satyayauga, dvaparayuga ou tretayuga. Esses fantasmas causam a discórdia entre os amigos e matam animais e crianças.
- Como se sabe que os fantasmas estão presentes? perguntou Garuda.
- Os sinais são bastante óbvios, disse Vishnu. Animais morrem e amigos brigam. Há catástrofes súbitas. As crianças se voltam contra seus pais, brahmanas são criticados e há más colheitas. Irrompe fogo por nenhuma razão em tudo. Marido e mulher lutam o tempo todo. Estes são os sinais.
-O que se faz quando se sabe que há fantasmas por aí? perguntou Garuda.
- Já indiretamente respondi às perguntas, respondeu Vishnu. Realizar uma cerimônia fúnebre para o fantasma. Mas também é bom consultar alguém que seja entendido nesses assuntos, um adivinho ou astrólogo (daivajna).


43. Dúvidas sobre a transmigração, do garuda purana

Existe uma hierarquia dos seres. Todos os seres vivos são divididos em quatro grupos. O primeiro grupo é constituído por aqueles que nascem de ovos, a segunda daqueles que nascem de suor, o terceiro de ervas e plantas, e o último dos mamíferos. Estes quatro grupos são, respectivamente, conhecido como andaja, svedaja, udbhijja e jarayuja.
Cada atman tem de nascer em cada uma dessas formas 21 vezes lakh (10mil), sujeita, naturalmente, aos punyas e feitos realizado em vidas anteriores. Isto é, uma atman tem que gastar 84 mil vidas na Terra.
Entre os mamíferos, os homens são superiores a todos os outros e é muito difícil para um atman nascer como um ser humano. É apenas se o atman adquiriu um lote de punya que nasce como um ser humano. Seres vivos são os melhores de todos os elementos, os seres vivos mais inteligentes, o melhor de todos os seres vivos, e os brâmanes são os melhores de todos os seres humanos.


44. Céus e infernos, no garuda purana

É importante ter um filho, para que sua linhagem possa ir em frente. Uma pessoa que não tem filho vai para o inferno punnama. É por isso que um filho é chamado de putra. Ele resgata (Trana) seu pai e seus antepassados outros do punnama naraka, o inferno chamado put.
Quando uma pessoa morre, mensageiros de Yama (yamaduta) chegam para levá-lo a Yama. Mensageiros de Yama são terríveis de aparência e possuem varas e paus nas mãos. O atman deixa o corpo físico morto e adota uma forma muito pequena, enquanto um dedo. Desta forma, a pessoa morta é levada para morada de Yama. As ações executadas na vida de alguém (karma) determinam o que vai acontecer com uma pessoa morta depois. Ele é o primeiro enviado para o inferno para ouvir a sua sentença pelos pecados que cometeu. Posteriormente, ele nasce de novo. E como ele nascerá depende do karma da vida anterior.
Para cuidar de diferentes tipos de pecadores, há Narakas diferentes.
O mais importante é naraka rourava, reservada para aqueles que mentem ou prestam falso testemunho. O inferno tem uma longa extensão e está cheia de buracos enormes. Estes poços estão cheios de carvão em brasa. O pecador é solto em uma extremidade do inferno e deve ir a pé até a outra extremidade. Naturalmente, ele continua caindo nos buracos e fica gravemente queimado. Quando ele chega ao outro lado do inferno, ele é liberado da rourava. Ele então vai para outros infernos se há outros pecados a ser contabilizados.
Outro inferno é chamado maharourava. É coberto com areias escaldantes. Os fogos que ardem lá são tão brilhantes que ferem os olhos do pecador. Mãos e pés do pecador e são amarrados e ele é jogado no inferno. Lá, ele queima. Para agravar suas misérias, o inferno é povoado por corvos ferozes, abutres, lobos, mosquitos e escorpiões. Estes o mordem, comem sua carne enquanto ele queima. Depois de vários anos passados em maharourava, os pecadores são liberados.
Ao contrário de rourava e maharourava, um inferno chamado atishita é extremamente frio. Não há luz lá e está tudo na escuridão total. O calor que os pecadores conseguir se dá pelo consumo dos órgãos uns dos outros. Há granizo que tornam a pele encarquilhada. E não há o que comer. Para satisfazer sua fome, os pecadores comem uns aos outros, carne e sangue e ossos.
O inferno chamado nikrintana é bem diferente. Pecadores ficam amarrados a estacas e seus corpos são cortados com chakras afiadas. O corte começa com o pé e depois muda do corpo para a cabeça e novamente começa com o pé. A parte trágica disso é que os pecadores não morrem no processo. Pois assim que uma parte do seu corpo é cortada, ela se junta novamente. Assim, um pecador não morre, mas continua a suportar a miséria. E assim continua por mil anos antes que haja liberação.
Um inferno chamado apratishtha é um lugar onde os pecadores giram em rodas até que eles começam a vomitar sangue e seus intestinos saem de suas bocas.
Asipatravana naraka é uma extensão enorme. As bordas do inferno são extemente quentes e há um bosque de árvores no centro. O centro é também mais frio. Os pecadores são soltos nas bordas e sofrem muito com o calor que eles passam em direção ao centro. Asi significa espada e patra é a lâmina de uma espada. Vana é uma floresta. O inferno é assim chamado porque as árvores do bosque têm folhas que são tão afiadas quanto as lâminas das espadas. Quando pecadores vão para o bosque, sua carne é cortada com as folhas das árvores. E o bosque também está cheio de cães ferozes que imediatamente comem a carne rasgada.
O Próximo é o inferno chamado taptakumbha. Isto é, quente (tapa) potes (kumbha). Os potes estão cheios de óleo fervente. Os pecadores são pendurados de cabeça para baixo dentro desses vasos e assados. E, enquanto eles estão sendo cozidos em óleo, abutres rasgam porções de seus corpos e continuam a ser expostos.
Há muitos infernos. Mas os sete mais importantes são os que acabam de ser describedrourava, maharourava, atishita, nikrintana, apratishtha, asipatravana e taptakumbha.
Todos os infernos estão localizados sob a terra. Os infernos são tão terríveis que em um único dia, parece como uma centena de anos na terra. A Prisão em qualquer naraka é por um período fixo. Quando todos as expiações em infernos diferentes foram cumpridas, é tempo para o pecador nascer de novo. E o que ele nasce é determinado pelo karma de sua vida anterior. O maior dos pecados que cometeu em sua vida anterior, determinará a sua forma de nascimento. E assim o ciclo de nascimento, expiação e renascimento continua.
Recompensas para punya são recebidos no céu. Mas estas recompensas não são para sempre. Uma vez que o prazo é longo, a pessoa tem que renascer.


45. Os quatro pilares do hinduísmo – artha, dharma, kama e moksha, no kama sutra

O período da vida de um homem é de cem anos, e ele deve praticar Dharma, Artha e Kama em momentos diferentes e de tal forma que possam se harmonizar juntos e não se chocar de forma alguma. Ele deve adquirir a aprendizagem em sua infância, em sua juventude e de meia idade, ele deve atender a Artha e Kama, e na sua velhice ele deve executar Dharma e, assim, procurar ganhar Moksha, ou seja, a libertação da transmigração. Por conta da incerteza da vida, ele pode praticá-los nos momentos em que eles forem necessários. Mas uma coisa é para ser notado, ele deve levar a vida de um estudante religioso até que ele termine sua educação.
Dharma é a obediência as regras dos Shastra ou Sagradas Escrituras dos hindus, o modo correto de fazer certas coisas, tais como a realização de sacrifícios, que geralmente não são feitos corretamente porque não pertencem a este mundo e não produzem nenhum efeito visível, e para não se fazerem outras coisas, como comer carne, o que geralmente é feito porque ela pertence a este mundo, e tem efeitos visíveis.
Dharma deve ser aprendido a partir do Shruti (Sagradas Escrituras), e daqueles familiarizados com ela.
Artha é a aquisição de artes, terra, ouro, gado, riqueza, bens e amigos. É, ainda, a proteção do que é adquirido, e do seu aumento.
Artha deve ser aprendido com os oficiais do rei, e com os comerciantes que podem ser versadom nas formas de comércio.
Kama é o gozo de objetos apropriados pelos cinco sentidos da audição, tato, visão, paladar e olfato, assistidos pela mente, juntamente com a alma. O ingrediente neste peculiar é um contato entre o órgão de sentido e de seu objeto, e a consciência do prazer que surge a partir desse contato é chamado de Kama.
Kama é para ser aprendido com o Kama Sutra e na prática dos cidadãos.
Quando todos os três, Dharma, Artha e Kama, se reúnem, o primeiro é melhor do que o que se lhe segue, ou seja, Dharma é melhor do que Artha, e Artha é melhor que Kama.


46. Dharma sutras – As regras para um asceta

Os votos seguintes deverão ser mantidos por um asceta:
Abster-se de ferir seres vivos, veracidade, abstenção quanto a apropriação de propriedade alheia, continência e liberalidade.
Há cinco votos menores, quais sejam a abstenção quanto à raiva, obediência para com o guru, evitar a imprudência, limpeza e pureza ao comer.
Vem agora a regra para esmolar. Que pergunte aos brâmanes, tanto os que têm casas quanto os de vida peregrina, quando a oferta de Vaishvadeva terminou.
Que faça a pergunta, antecedendo-a com a palavra "bhavat”.
Que esmole de pé não mais do que o tempo necessário para ordenhar uma vaca.
Quando regressar disso, ponha as esmolas em lugar seguro, lave mãos e pés e anuncie o que obteve ao sol.
Dando piedosamente porções de seu alimento aos seres vivos e aspergindo o restante com água, ele comerá como se o alimento fosse um remédio.
Que coma alimentos dados sem pedir, sobre os quais nada tenha sido combinado antecipadamente e lhe tenham chegado por acidente e apenas o bastante para sustentar sua vida.
Em seguida eles citam os versos: "Oito bocados perfazem a refeição de um asceta, dezesseis a de um eremita na floresta, trinta e dois a de um chefe de família, uma quantidade ilimitada de um estudante".
"As esmolas podem ser obtidas de homens das três castas, ou pode ser comido o alimento dado por um único brâmane; ou então poderá obter alimento de homens de todas as castas, e não comer o que for dado por um único brâmane".
Em seguida, citam as regras especiais para o caso em que os mestres expliquem a doutrina os seguintes Upanishads: "De pé diligentemente durante o dia, mantendo silêncio, sentado a noite com pernas cruzadas, banhando-se três vezes por dia e comendo apenas na quarta, sexta ou oitava hora de refeição, ele subsistira inteiramente com grãos de arroz, bolo de linhaça, alimento preparado com cevada, leite azedo e leite".
Está declarado nos Vedas: "Nessa ocasião ele se manterá em silêncio rígido; apertando os dentes ele poderá conversar, sem abrir a boca, tanto quanto for necessário e com mestres profundamente versados nos três Vedas e ascetas com grande conhecimento das escrituras, e não com mulheres, nem quando assim fazendo quebraria seu voto".
Que observe apenas uma das regras que ordenam ficar de pé durante o dia, silêncio rígido e sentar-se a noite com pernas cruzadas; que não observe todas as três conjuntamente.
Está declarado nos Vedas: "E aquele que foi lá pode comer, em ocasiões difíceis, uma pequena quantidade do alimento prescrito para seu voto, depois de ter partilhado em outros pratos, desde que não quebre seu voto".
"Oito coisas não levam, aquele que pretende estar de pé durante o dia, manter o silêncio rígido, sentar-se a noite com pernas cruzadas, banhar-se três vezes por dia e comer apenas na quarta, sexta ou oitava hora de refeição, a quebrar o seu voto, ou seja, a água, raízes, manteiga clareada, leite, alimento sacrifical, do prato e um brâmane, uma ordem de seu pai e o remédio".
"Um asceta não manterá fogo, não terá casa, nem lar, nem protetor. Poderá entrar em uma aldeia para pedir esmolas e emitir fala na recitação particular dos Vedas".


47. A visão religiosa jaina

Toda alma é independente. Nenhuma depende de outra.
Todas as almas são iguais. Nenhuma é superior ou inferior.
Toda alma é, em si absolutamente onisciente e feliz. A felicidade não vem de fora.
Todos os seres humanos são infelizes devido às suas próprias faltas, e eles próprios podem ser felizes, corrigindo essas falhas.
O maior erro de uma alma é o não reconhecimento de seu verdadeiro eu e isso só pode ser corrigido através do reconhecimento de si mesmo.
Não há existência separada de Deus. Todo mundo pode atingir Deus fazendo esforços supremos na direção certa.
Conhece a ti mesmo, reconhecer-te, ser imerso por ti, e você vai alcançar a divindade.
Deus não é nem o criador nem o destruidor do universo. Ele é apenas um observador silencioso e onisciente.
Aquele que, mesmo depois de conhecer todo o universo, pode permanecer inalterado e desapegado, é Deus.
Luta consigo mesmo, por que lutar com inimigos externos? Aquele que vence a si mesmo através de si mesmo, obterá felicidade.
Todos os seres odeiam e sofrem, portanto, não se deve matá-los feri-los. Ahimsa (não violência) é a maior religião.
Um homem está sentado em cima de uma árvore no meio de uma floresta em chamas.Ele vê todos os seres vivos perecerem. Mas ele não percebe que o mesmo destino está prestes a alcançá-lo também. Este o homem é tolo.


48. A visão da religião budista – dhamapada

O melhor dos caminhos é óctuplo (Doutrina Correta, Propósito Correto, Discurso Correto, Modo de portar-se Correto, Pureza Correta, Pensamento Correto, Solidão Correta, Êxtase Correto); a melhor das verdades, as quatro palavras; a melhor das virtudes, a indiferença; o melhor dos homens é o que tem olhos para ver.
É este o caminho, não há outro que leve à purificação da inteligência. Vá por este caminho! Eis a confusão de Mara, o tentador.
Se você seguir este caminho, você porá fim à dor! Eis o caminho que eu aconselhei, quando compreendi a remoção dos espinhos na carne.
Você mesmo deve fazer um esforço. Os Tathagatas (Budas) são pregadores apenas. O meditativo que entra nesse caminho fica livre da escravidão de Mara.
- "Todas as coisas criadas perecem" - aquele que sabe e vê isso torna-se passivo no sofrimento; eis o caminho para a purificação.
- "Todas as coisas criadas são pesares e dores" - aquele que sabe e vê isto torna-se passivo na dor; eis o caminho que leva à purificação.
- "Todas as formas são irreais" - aquele que sabe e vê isto torna-se passivo na dor; eis o caminho que conduz à purificação.
Aquele que não se levanta quando é tempo de levantar-se, que, embora jovem e forte, é indolente, cuja vontade e pensamento são fracos, esse homem preguiçoso e indolente jamais encontra o caminho do saber.
Observando suas palavras, com o espírito bem domado, que um homem jamais cometa qualquer erro com o seu corpo! Que um homem apenas guarde essas três veredas de ação bem desimpedidas e alcançará o caminho que os sábios indicam.
Por meio do zelo ganha-se o saber, por meio da falta de zelo nós o perdemos; deixemos que um homem que conheça esse caminho duplo de ganho e perda assim se coloque a fim de que o conhecimento possa crescer.
Abate uma floresta inteira de desejos, e não apenas uma árvore! O perigo provém da floresta de desejos. Quando tiverem abatido tanto a floresta de desejos como as plantas rasteiras, então, Bhikshu, estareis livres da floresta e dos desejos!
Enquanto houver o desejo do homem pelas mulheres, mesmo que seja menor, sem ter destruído, seu espírito estará escravizado, assim como o bezerro que mama está escravizado à sua mãe.
Extirpa o amor-próprio, como um lótus outonal, com tua mão! Tem em alta conta a estrada da paz. O Nirvana foi mostrado por Sugata (Buda).
- "Aqui viverei na chuva, aqui ficarei inverno e verão" - assim medita o tolo, e não pensa na morte.
A morte vem e faz desaparecer aquele homem, respeitado pelos filhos e parentes, seu espírito se separa, assim como a inundação faz desaparecer uma aldeia adormecida.
Os filhos nada adiantam, sem um pai, nem os parentes; não há auxílio da parte dos parentes que valha para aquele de quem a morte se apossou.
Um homem sábio e de bom comportamento que compreenda o significado disto, depressa desbravará o caminho que leva ao Nirvana.


49. Éditos ecumênicos de Ashoka

O fruto do Esforço
Assim diz Sua Majestade Sagrada: - Por mais de dois anos e meio anos eu fui um discípulo leigo, sem, no entanto, exercitar-me seriamente. Mas há mais de um ano desde que entrei para a Ordem, e me exercito seriamente. Durante esse tempo, os deuses que eram considerados como verdadeiros em toda a Índia têm demonstrado serem falsos. Isso é o fruto de esforço. E isso não é suscetível de ser atingido por um grande homem só, porque até mesmo pelo pequeno homem que escolhe exercer-se a imensa felicidade celeste pode alcançá-lo. Para este efeito, o preceito foi escrito: - "Que pequenos e grandes exercitem-se." Meus vizinhos também devem aprender esta lição, e podem também fazer grandes esforços! E esse propósito vai crescer - sim, ela vai crescer imensamente - pelo menos uma e meia vezes vai aumentar em crescimento. E essa finalidade deve ser escrita nas rochas, tanto aqui quanto longe, e, onde quer que haja um pilar de pedra, deve ser escrito nesse pilar de pedra. E de acordo com este texto, tanto quanto a sua jurisdição se estende você deve enviá-lo por toda parte. Porque (eu) enquanto estava em viagem compus esse preceito.

Resumo da Lei da Piedade
Assim diz Sua Majestade Sagrada: - Pai e mãe devem ser ouvidos, do mesmo modo, o respeito pelos seres vivos deve ser firmemente estabelecido, e a verdade deve ser falada. Estas são as virtudes da Lei de Piedade, que deve ser praticada. Da mesma forma, o professor deve ser reverenciado pelo aluno, e para as relações de cortesia, deve-se mostrar o melhor possível. Esta é a natureza antiga (da piedade) - isto dura apenas um dia para aprender, o modo como um homem deve agir. Escrito por Pada, o escriba.


50. O movimento devocional vaisnava de Caytania

Pergunta: Que conhecimento é o superior a todos?
Resposta: Não há conhecimento, mas apenas devoção a Krishna.
Pergunta: Qual a mais alta glória em todos os tipos de glória?
Resposta: ser considerado devoto de Krishna.
Pergunta: Que se conta como riqueza entre as posses humanas?
Resposta: Imensamente rico é quem tem amor por Radha-Krishna.
Pergunta: Qual é a maior das tristezas?
Resposta: Não há tristeza, a não ser a separação de Krishna.
Pergunta: Quem se considera libertado entre os que foram libertados?
Resposta: Principal entre os libertados é quem pratica a devoção a Krishna.
Pergunta: Entre as canções, qual aquela natural às criaturas?
Resposta: A canção cujo coração fala dos amores de Radha-Krishna.
Pergunta: Qual o maior bem de todas as criaturas?
Resposta: Não existe algum, a não ser a sociedade daqueles que se devotam a Krishna.
Pergunta: De quem as criaturas se lembram incessantemente?
Resposta: As coisas principais a lembrar são o nome, qualidades e diversões de Krishna.
Pergunta: Entre os objetos de meditação, em quais devem meditar as criaturas?
Resposta: A meditação suprema é sobre os pés de lótus de Radha-Krishna.
Pergunta: onde deviam morar todas as criaturas, deixando tudo o mais?
Resposta: Na terra gloriosa de Brindaban (terra de Krishna), onde a dança de Krishna é eterna.
Pergunta: Qual a melhor das coisas a serem ouvidas pelas criaturas?
Resposta: Os jogos amorosos de Radha-Krishna são um deleite para o ouvido.
Pergunta: o que é principal entre os objetos de adoração?
Resposta: o nome do casal mais adorável, Radha-Krishna.


51. O movimento devocional shivaíta

Eu reverencio Shiva o consorte de Gaurî, a única causa da origem, sustentação, dissolução do universo, que percebeu a realidade, que é de infinito renome, que é o apoio de Maya mas é livre de sua influência, cuja forma é incompreensível, que é imaculado e que é o perfeito conhecimento em si.
Eu saúdo Shiva que é anterior a Prakrti, que é calmo e tranqüilo, o único excelente Purusha, que criou o universo visível e que permanece tanto dentro quanto fora em forma de Éter.
Eu saúdo Shiva, de forma imanifesta, que tendo se estendido através da criação permanece no meio dela enquanto os mundos se movem ao redor dele como limalhas de ferro ao redor de um imã. (shiva purana)

.........

Em um estado tranqüilo, possuindo o resplendor de dez milhões de Luas; vestido com peles de tigre; usando o fio sagrado feito com uma serpente; Todo o seu corpo é coberto com cinzas; usa serpentes como ornamentos; Suas cinco faces são das cores vermelho-escuro, amarelo, rosa, branco e vermelho, com três olhos cada; Sua cabeça é coberta com cabelo emaranhado; Ele é Onipresente; Sustêm Gangâ (o rio Ganges) em sua cabeça, e tem dez braços; em Sua fronte brilha a Lua crescente; Em Sua mão esquerda, Ele segura o crânio, o fogo, o laço, o Pinâka (arma) e o machado, e em Sua mão direita, o tridente, o raio (vajra), a flecha e as bençãos; Ele está sendo louvado por todos os Deuses e os grandes Sábios; Seus olhos estão semi-abertos pelo excesso de êxtase; Seu corpo é branco como a neve, a flor Kunda e a Lua; Ele está sentado em um Touro; Noite e dia, ele é rodeado em ambos os lados pelos Siddhas (libertos), Gandharvas (músicos celestes) e Apsarâs (ninfas celestes), que cantam hinos em Seu louvor; Ele é esposo de Ûma; o dedicado Protetor de Seus devotos. (Mahanirvana Tantra)


52. Cultos Tântricos

Em meio ao oceano de Néctar, onde encoberta por grupos de árvores celestialmente desejosas se encontra a Ilha as Gemas Preciosas, na mansão das jóias desejosas com seu grupo de árvores nipa, num leito composto de Shiva e demais deuses, teu assento um colchão que é Shiva Supremo - alguns poucos felizardos te adoram, cheios de consciência e ventura.
A terra no muladhara, a água no manipura, o fogo situado no svadhishthana, o ar no coração e o éter acima dele, a mente entre as sobrancelhas - em suma, tendo perfurado todo o caminho kula, no lótus de mil pétalas tu brincas em segredo com teu senhor.
Com correntes de néctar correndo por entre teus pés e aspergido o universo, divertindo-te pelo poder de recitar os textos sagrados que produzem os seis círculos, novamente chegas à tua morada e na forma de uma serpente em três e meio anéis tu te convertes e dormes na concavidade kulakunda.
Por motivo dos quatro e dos cinco triângulos que são perfurados pelo bindu e constituem os triângulos básicos, quarenta e três - juntamente com os lótus e oito e dezesseis pétalas por fora dos triângulos, e os três círculos por fora dos lótus e as três linhas por fora dos círculos – ângulos de teu lugar de morada são formados.
Para igualar tua beleza, ó filha da montanha de neve, dificilmente os maiores poetas têm qualquer êxito; os cortesãos celestiais que a entreviram, por seu desejo de desfrutá-la passam em imaginação a se identificar com Shiva residente da Montanha, que é difícil de atingir mesmo pelas práticas ascéticas...[...]

.....

Deva, quintessência do êxtase supremo, o Senhor de Kula, da própria essência do conhecimento do oceano de Kula Tantra, ocultado pela minha Maya.
Eu sou a Grande Natureza, consciência, êxtase, a quintessência, exaltada com devoção. Onde Eu estou, não há Brahma, Hara, Shambhu ou outros devas (deuses), nem há criação, preservação ou dissolução. Onde Eu estou, não há apego, felicidade, tristeza, liberação, bondade, fé, ateísmo, guru ou discípulo. Quando Eu, desejando a criação, cubro a mim mesma com minha Maya e torno-me tríplice, tornando-me extática em meu exuberante jogo de amor, Eu sou Vikarini, dando origem às várias coisas."
"Ó, Ser que tudo sabe, se Eu sou conhecida, que necessidade há de escrituras reveladas e sadhana (disciplina)? Se Eu não sou conhecida, qual a utilidade de puja (oferendas) e textos revelados? Eu sou a essência da criação, manifestada como mulher, inebriada com desejo sexual, a fim de conhecer-te como guru, tu com o qual Eu sou uma. Ainda assim, Mahadeva, Minha verdadeira natureza ainda permanece secreta. (Kulachudamani Tantra)



53. Cantos de Kabir

"Tu és Isso", é a pregação dos Upanishads; esta, a sua mensagem.
Grande sua confiança nisto; mas como podem, por mais poderosos, descrevê-lo?
Pândita, teus pensamentos são todos inverídicos; não há aqui qualquer universo ou criador;
Nem sutil, nem bruto, nem ar, nem fogo, nem sol, nem lua, nem terra, nem água;
Nem a forma da luz, nem o tempo existem; não há palavra nem corpo.
Não há ação ou virtude, nem mantras, nem adoração absolutamente.
Os ritos e cerimônias não tem valor algum.
Ele é um e não há segundo.
Onde quer que se olhe, lá, lá Ele é o mesmo; Ele se acha em todos os recipientes.
Como posso explicar sua forma ou esboço? Não há um segundo que o tenha visto
Como posso descrever a condição do incondicionado, que não tem aldeia ou lugar de descanso?
Aquele que deve ser visto sem qualidades; por qual nome o chamarei?
Quando o fogo da avareza acaba, e a fumaça dos desejos não mais se alça.
Então o homem saberá que um Deus está contido em toda parte, e não há um segundo.
Aquele que reúne reside sempre separado de sua obra.


54. O surgimento dos Sikhs

Os celibatários, os fanáticos e os cantores pacificamente aceitam de você; os guerreiros destemidos cantam de você.
O Pandits, os estudiosos religiosos que recitam os Vedas, os sábios supremos de todas as idades, cantam de você.
O Mohinis, a encantadora belezas celestiais que seduzem corações no paraíso, neste mundo e no submundo do subconsciente, cantar de você.
As jóias criadas por ti, e os santuários sagrado de peregrinação, cantam de você.
O bravos guerreiros e valentes cantam de você. Os heróis espirituais e as quatro fontes de criação cantam Você.
Os mundos, sistemas solares e galáxias, criados e organizados por sua mão, cantam de você.
Eles cantam sozinhos de você, que são agradáveis a Sua Vontade. Seus devotos são imbuídos com a sua essência Sublime.
Tantos outros cantam de você, eles não vêm à mente. O Nanak, como posso pensar em todos eles?
Isso, Senhor Verdadeiro, é verdadeiro, sempre verdadeiro, e verdadeiro é o Seu Nome.
Ele é, e será sempre. Ele não deve partir, mesmo quando este Universo que Ele criou parte.
Ele criou o mundo, com suas cores, espécies de seres, e a variedade de Maya.
Tendo criado a criação, Ele cuida de Si mesmo, pela sua grandeza.
Ele faz aquilo que lhe agrada. Ninguém pode emitir qualquer ordem para ele.
Ele é o Rei, o Rei dos reis, o Senhor Supremo e Mestre dos reis. Nanak continua sujeito a Sua Vontade.


55. Akbar, o Sulak kul e o Dabistan – a tolerância islâmica na Índia

"Ó Tu, cujo nome é o começo do livro das crianças nas escolas,
Tua lembrança é para os adultos e os Sábios que ilumina à noite na velhice;
Sem o teu nome a língua é o palato dos bárbaros,
Embora saibam a linguagem da Arábia;
Tenham o coração e no corpo inteiro a tua lembrança,
Na contemplação do novato ou do iniciado
Torna-se um rei supremo da bem-aventurança, e o trono do reino da alegria.
Qualquer estrada que eu siga, que se juntem e que levem a Ti;
O desejo de conhecer o teu ser é também a vida dos meditadores;
Eles que descobriram que não há nada além de Ti, descobriram o conhecimento final;
O Mobed (clérigo zoroastrista) é o professor da tua verdade, e o mundo, uma escola."
Bênção sem limite para o Ser poderoso, o Senhor da existência, o piloto sobre o sol da esfera celeste, que é a testemunha ocular da sua glória;
A Ele cujo servo é Saturno, Baharam (Marte) o mensageiro, Júpiter a estrela arauto de sua boa sorte, Vênus seu escravo; Àquele que é o ornamento do trono do império da fé, e a coroa da divindade do reino da verdade "
Masnavi;
"O ser a quem o santo Deus disse:
Se não ti, eu não teria criado o mundo;
Essa sabedoria primitiva e que é a alma do mundo;
Que é o homem de espírito, e que é o espírito do homem.
Bênção também para o califa dos fiéis, e os Senhores da Imans da fé. "
Rabaâí (quadra).
"O mundo é um livro cheio de conhecimento e de justiça,
A capa do livro é o destino, e a ligação do início e do fim;
A costura é a lei, e as folhas são as convicções religiosas;
Toda a nação é formada por seus discípulos, e o apóstolo é o professor. "
Neste livro, chamado "O Dabistan", está contido um pouco do conhecimento e da fé das nações passado, dos discursos e ações das pessoas modernas, como foi relatado por aqueles que sabem o que é manifesto, e viram o que está oculto; bem como por aqueles que estão ligados a formas exteriores, e por aqueles que discernem o significado interior, sem omissão, e diminuição, sem inveja, ódio e desprezo, e sem tomar uma parte para o um, ou contra o outro lado das perguntas.


56. A multireligiosidade de Ramakrishna

Vês muitas estrelas à noite no firmamento, mas não as encontras quando nasce o Sol; podes dizer que não há estrelas no céu durante o dia? Assim, ó homem, porque não contemplas Deus nos dias de tua ignorância, não digas que não há Deus.
Assim como um único e mesmo material, a água, é chamado por nomes diferentes por povos diferentes, uns a chamam água, outro eau, um terceiro aqua, e outro pani, assim também o Sat-chit-amanda, o imortal onisciente, é invocado por alguns como Deus, por alguns como Alá, por alguns como Jeová, por alguns como Hari e por outros como Brama.
Assim como alguém pode subir ao alto de uma casa por meio de uma escada de pau, de bambu ou de corda, ou de uma corda, assim também diversos são os caminhos para se aproximar de Deus, e cada religião do mundo mostra um desses caminhos.
As diferentes crenças não são mais que caminhos diferentes para se chegar ao Altíssimo. Vários e diferentes são os caminhos que levam ao templo da Mãe Kali em Kalighat (Calcutá). Do mesmo modo, vários são os caminhos que levam à casa do Senhor. Cada religião nada mais é que um de tais caminhos que levam a Deus.
Assim como uma jovem esposa mostra em sua família respeito pelo sogro, pela sogra e por todos os membros da família e, ao mesmo tempo, ama seu marido mais do que aqueles, do mesmo modo, mostrando-te firme na devoção da divindade de tua própria escolha (Ishta-Devata), não desprezas as outras divindades, mas as honras todas.
Curva-te e venera quando os outros se ajoelham, pois onde tantos estão prestando o tributo da adoração, o Senhor misericordioso deve se manifestar, eis que ele é todo misericórdia.
O Sat-chit-ananda tem muitas formas. O devoto que viu o seu Deus somente sob um aspecto o conhece apenas sob aquele aspecto. Mas somente o que viu sob múltiplos aspectos está em condições de dizer: "Todas essas formas são de um deus e Deus é multiforme". Ele é informe e com forma, e muitas são as suas formas que ninguém conhece.
Os Vedas, Tantras e Puranas e todas as sagradas escrituras do mundo tornaram-se maculadas (como todo alimento lançado fora da boca se torna poluído) porque foram constantemente repetidas e saíram de bocas humanas. Mas o Brama e o Absoluto jamais se macularam, pois ninguém jamais foi capaz de expressá-lo pela fala humana.
A agulha magnética sempre aponta para o norte, e graças a isso os navios que navegam não perdem o rumo. Enquanto o coração do homem está voltado para Deus, ele não pode perder-se no oceano do mundo.
Em verdade, em verdade te digo que aquele que O procura O encontrará. Verifica isso em tua própria vida; experimenta, por três dias consecutivos, com fervor sincero, e podes estar certo de que serás bem sucedido.
Deus não pode ser visto enquanto houver o mais leve sinal de desejo; portanto, satisfaze teus pequenos desejos e renuncia os grandes desejos pelo certo raciocínio e discriminação.
Conhecer e amar Deus são, em última análise, a mesma coisa. Não há diferença entre o puro conhecimento e o puro amor.


57. Filosofia religiosa de vivekananda

Este é o grande ideal à nossa frente e todos devem estar prontos para ele - a conquista de todo o mundo pela Índia - nada menos do que isso, e devemos preparar-nos todos para isso, mobilizar todos os nossos nervos para a tarefa. Que venham os estrangeiros com seus exércitos e inundem o país! Acima, Índia, e conquista o mundo com tua espiritualidade! Sim, como foi declarado pela primeira vez neste solo, o amor deve conquistar o ódio, o ódio não pode vencer a si próprio. O materialismo e todas as suas misérias jamais poderão ser vencidos pelo materialismo. Quando exércitos tentam vencer exércitos, apenas multiplicam-se e tomam embrutecida a humanidade. A espiritualidade deve conquistar o Ocidente. Lentamente eles descobrem que aquilo que buscam é a espiritualidade, para conservá-los como nações. Estão esperando por ela, ansiosos por ela. De onde deverá vir o fornecimento? Onde estão os homens prontos a partir para todos os países no mundo com as mensagens dos grandes sábios da Índia?
Onde estão os homens prontos a sacrificar tudo, para que essa mensagem atinja todos os cantos do mundo? Tais almas heróicas são procuradas para ajudar a espalhar a verdade. Tais obreiros heróicos são procurado para ir ao estrangeiro e ajudar; disseminar as grandes verdades do Vedanta. O mundo quer isso, e sem isso o mundo será destruído. Todo o mundo ocidental é um vulcão que poderá entrar em erupção amanhã e estourar amanhã. Eles procuraram em todos os cantos do mundo e não encontraram descanso. Eles beberam bastante na taça do prazer e descobriram que era vaidade. Chegou a hora de trabalhar para que as idéias espirituais da Índia possam penetrar profundamente no Ocidente. Por isso, jovens de Madrasta, peço-lhes especialmente para que se lembrem disto: devemos partir, devemos conquistar o mundo através de nossa espiritualidade e filosofia. Não há alternativa, ou fazemos isso ou morremos. A condição única de vida nacional, de vida nacional desperta e vigorosa, é a conquista do mundo pelo pensamento indiano.


58. A religiosidade em Gandhi

Minha experiência uniforme convenceu-me de que não existe outro Deus, a não ser a Verdade, e se cada página destes capítulos não proclamar ao leitor que o único meio de atingi-la é a não-violência, considerarei todo o meu trabalho escrito como sendo em vão e embora meus esforços neste particular possam mostrar-se infrutíferos, saibam os leitores que o veículo, e não o grande princípio, é que merece a culpa. Afinal, por mais sinceros que possam ser meus esforços no sentido do Ahimsa, ainda assim se mostraram imperfeitos e inadequados. Os curtos lampejos que consegui ter da Verdade, portanto, facilmente podem dar uma idéia do brilho indescritível que ela tem, um milhão de vezes mais intenso do que o do sol diariamente visto com nossos olhos. O que realmente entrevi foi apenas o mais apagado reflexo daquela luminosidade poderosa, mas posso dizer com certeza e como resultado de minhas experiências que uma visão perfeita da Verdade só pode ser obtida mediante uma realização completa do Ahimsa.
Para ver o Espírito da Verdade universal e presente em toda parte face a face, é preciso saber amar o mais modesto ser da criação como a si próprio um homem que aspire a isso não pode manter-se afastado de qualquer terreno da vida. É por isso que minha devoção pela Verdade me levou ao terreno da política, e posso afirmar sem a menor hesitação, embora com toda a humildade, que quem diz nada ter a religião a ver com a política não sabe o que quer dizer religião.
A identificação com tudo que vive é impossível sem a autopurificação, e sem esta a observância da lei do Ahimsa tem de continuar sendo um sonho vazio. Deus jamais poderá ser compreendido por quem não for de coração puro. Por isso a autopurificação deve significar purificação em todos os escalões da vida, e esta sendo altamente contagiosa, faz que a purificação de si próprio leve à do ambiente em que se vive.
O caminho da autopurificação, entretanto, é duro e íngreme. Para chegar à pureza perfeita é preciso que nos tomemos absolutamente livres de paixão no pensamento, fala e ação ergamo-nas acima das correntes opostas do amor e do ódio, ligação e repulsa. Sei que não tenho ainda em mim essa pureza tripla, a despeito de esforços constantes para atingi-la. É por isso que o louvor do mundo deixa de me impelir, e na verdade muitas vezes me fere. Vencer as paixões sutis parece-me mais difícil do que vencer fisicamente o mundo pela força as armas.
Desde que regressei à Índia tive experiências das paixões adormecidas ocultas em mim. O conhecimento das mesmas me fez sentir humilhado, embora não derrotado. As experiências me sustentaram e deram grande alegria, mas sei ter ainda diante de mim uma trilha difícil a percorrer. Tenho de me reduzir à zero. Enquanto um homem não se colocar por sua própria vontade em último lugar entre seus semelhantes, não haverá salvação para ele. Ahimsa é o mais extremo limite da humildade.
Ao me despedir do leitor, pelo menos por esta vez lhe peço que se junte a mim em oração ao Deus da Verdade, para que lhe possa conceder-me a graça do Ahimsa em mente, palavra e feito.

.......

Creio na verdade fundamental de todas as grandes religiões do mundo. Creio que são todas concedidas por Deus e creio que eram necessárias para os povos a quem essas religiões foram reveladas. E creio que se pudéssemos todos ler as escrituras das diferentes fés, sob o ponto de vista de seus respectivos seguidores, haveríamos de descobrir que, no fundo, foram todas a mesma coisa e sempre úteis umas às outras.


59. Novo hinduísmo, de Aurobindo Ghose

O que é a religião hindu? O que é esta religião a que chamamos Sanatan, eterna? É a religião hindu apenas porque a nação hindu a manteve, porque nesta península ela cresceu na separação imposta pelo mar e pelos Himalaias, porque nesta terra sagrada e antiga ela foi dada à raça ariana para ser conservada através das idades.
Mas não se circunscreve aos confins de um único país, não pertence particularmente e para sempre a uma determinada parte do mundo.
Aquilo a que chamamos religião hindu é na verdade a religião eterna, pois é a religião universal que abarca todas as outras. Se uma religião não for universal, não poderá ser eterna. Uma religião estreita, sectária, exclusiva, só poderá viver por tempo limitado e tendo um fito limitado. Esta é a religião que pode triunfar sobre o materialismo, incluindo e se antecipando às descobertas da ciência e especulações da filosofia. É a religião que faz ver à humanidade a proximidade
de Deus e abarca em seu âmbito todos os meios possíveis pelos quais o homem pode aproximar-se de Deus. É a religião que insiste a todo instante sobre a verdade reconhecida por todas, a de que Ele está em todos os homens e em todas as coisas e que n’Ele nós agimos e temos nosso ser. É a religião que nos capacita não só a compreender e acreditar nessa verdade, mas também senti-la com todas as partes de nosso ser. É a religião que mostra ao mundo o que o mundo é, a Diversão de Deus. É a religião que nos mostra como podemos desempenhar melhor nosso papel nessa Diversão, suas leis mais sutis e suas regras mais nobres. É a religião que não separa a vida em qualquer detalhe mínimo quanto à religião, que sabe o que é a imortalidade e retirou por completo de nós a realidade da morte. Esta é a palavra que foi posta em meus lábios para que a pronunciasse hoje. O que eu pretendia dizer foi afastado de mim e além do que me é dado, nada tenho a dizer. Apenas a palavra que me é dada eu posso pronunciar. Essa palavra terminou agora. Falei uma vez antes com esta força em mim e disse então que este movimento não é um movimento político e o nacionalismo não é política, mas uma religião, um credo, uma fé. Digo-o mais uma vez hoje, mas apresento- o e outro modo. Não digo mais que o nacionalismo é um credo, uma religião, uma fé, mas que o Sanatan Dharma para nós é nacionalismo.
Esta nação hindu nasceu com o Sanatan Dharma, com ele marcha e cresce. Quando o Sanatan Dharma declina, a nação declina e se o Sanatan Dharma pudesse desaparecer, com ele ela desapareceria, o Sanatan Dharma que é nacionalismo. Esta a mensagem que tenho para transmitir.


60. Hinduísmo moderno – Radhakrishnan

O objetivo da religião é o de nos erguer de nosso provincianismo momentâneo e despido de significado, levando-nos à importância e posição do eterno, transformar o caos e a confusão da vida naquela essência pura e mortal que é sua possibilidade ideal. Se a mente humana se modifica de modo a estar perpetuamente na glória da luz divina, se as emoções humanas se transformam nas medidas e movimento da ventura divina, se a ação humana partilha da capacidade criadora da vida divina, se a vida humana partilha da pureza da essência divina, se pudermos sustentar essa vida mais elevada, o longo trabalho do processo cósmico receberá sua justificação final e a evolução dos séculos desdobrará seu significado profundo. A divinização da vida do homem no indivíduo é o sonho das grandes religiões. É o moksha dos hindus, o nirvana dos budistas, o reino do céu dos cristãos. Para Platão, é a vida da percepção desimpedida da idéia pura. É a compreensão da forma nativa do homem, a restauração da sua integridade de ser. O céu não é o lugar onde Deus vive, mas uma ordem de ser, um mundo de espírito onde as idéias de sabedoria, amor e beleza existem eternamente, um reinado no qual podemos ingressar imediatamente em espírito, que podemos compreender inteiramente em nós mesmos e na sociedade apenas através e esforço longo e paciente. A expectativa do segundo advento é a expressão da convicção da alma quanto à realidade do espiritual. O processo do mundo atinge sua consumação quando todos os homens sabem que são o espírito imortal, o filho de Deus, e o são. Até se chegar a essa meta, cada individuo salvo é o centro da consciência universal. Ele continua a agir sem o sentido, do ego. Ser salvo não é ser retirado do mundo. A salvação não é fuga à vida. O individuo não opera mais no processo cósmico como um ego obscuro e limitado, mas como um centro da consciência divina ou universal que abarca e transforma em harmonia todas as manifestações individuais. É viver no mundo com o interior profundamente modificado. A alma toma posse de si própria e não pode ser abalada de sua tranqüilidade pelas atrações e ataques do mundo. Se o individuo salvo foge literalmente do processo cósmico, o mundo ficaria para sempre irremisso, ficaria condenado a continuar sendo por todo o tempo o palco de luta e treva intermináveis. Os hindus afirmam graus diferentes de libertação, mas a completa e final é a ultima. O Bhagavata Purana registra a oração seguinte: "Não desejo o estado supremo com todas as suas oito perfeições, nem tampouco a libertação quanto ao renascimento; seja-me permitido tomar a tristeza de todas as criaturas que sofrem e entrar nelas, de modo que possam libertar-se da aflição. A auto-realização a que aspiram é incoerente com o deixar de conseguir resultados semelhantes nos outros. Este respeito pelo individuo como individuo não é a descoberta da democracia moderna, no que diz respeito à esfera religiosa. Quando o processo cósmico resultar na revelação de todos os filhos de Deus, quando todo o povo do Senhor se tomar profeta, quando esta encarnação universal tiver lugar, o grande renascimento cósmico de que a Natureza luta por se libertar estará consumado.


61. A universalidade religiosa, Raimon Panikkar

O Paraíso é hoje! O futuro das religiões é, pois um pseudo-problema! A minha proposta se refere à conversão das religiões, que sempre pensaram em converter os outros: ora, são eles a serem chamados a converter-se! Este é o kairós do milênio que recém se abriu para todas as religiões: continuar com pequenas reformas não tem sentido, é necessária uma grande transformação, não violenta, lenta porém profunda, uma metánoia! Tal conversão deveria tornar as religiões cônscias, seja de quanto mal têm feito na história, seja que agora o infiel está perto de casa, que todas as coisas as vemos – ainda – com a lente de aumento do outro. É uma espécie de nec cum te nec sine te [nem contigo nem sem ti]... {...} Gostaria de dizer que talvez as religiões devessem concentrar-se menos no nirvana, a mukti, a salvação, o céu e assim por diante, e concentrar os próprios esforços no objetivo de curar as feridas humanas, curar as páginas históricas da humanidade: numa palavra, na cultura da paz mais do que na pregação da salvação. Há muita sabedoria, por exemplo, em algumas religiões africanas que não se preocupam particularmente pelo Deus Supremo, e, ao invés dirigem a sua atenção para os deuses menores que criam problemas ou oferecem remédios. Sem querer ser paradoxal, poder-se-ia afirmar que as religiões faliram porque este é o seu karma, ou antes, a sua natureza: de fato, elas nos recordam constantemente a renúncia aos frutos, a ação desinteressada, a morte do Ego, e assim por diante. As religiões não são a panacéia humana, e como o próprio homem são itinerantes, provisórias, imperfeitas. Mostram a lua refletida no pântano, não a lua no céu, para utilizar uma metáfora budista: não oferecem a solução; oferecem-nos, antes, a esperança sempre renovada de continuar a viver, a lutar, a descobrir e a não renunciar à autêntica condição humana... Devem, em síntese, fazer continuamente metànoia!.

Nenhum comentário:

Postar um comentário